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19.3.24

Diretora do Juliano Moreira diz que SUS não tem condições de atender pacientes que vão deixar o Complexo até maio

 Diretora do Complexo Juliano Moreira afirma que há um número muito pequeno de residências terapêuticas e são poucas vagas para atender os pacientes.

O prazo para retirar todos os internos da penitenciária forense, manicômios e hospitais de custódia é 15 de maio e, desde 28 de fevereiro, esses locais não podem receber novos pacientes. A questão é que muitos deles não teriam condições de retornar à sociedade. E o que fazer com essas pessoas? A psiquiatra Camilla Franca, diretora técnica do Complexo Psiquiátrico Juliano Moreira, falou sobre o assunto durante o programa Arapuan Verdade desta terça-feira (19), como acompanhou o ClickPB. 

Questionada se o SUS tem estrutura para receber esses pacientes, ela respondeu que não como deveria ser. “Tudo isso tem no serviço público, mas não na quantidade necessária. Temos um número muito pequeno de residências terapêuticas. São poucas vagas. Precisa fundamentar isso. Não que o paciente não tenha condição de ser reinserido na sociedade. Tem se fizermos um plano para isso. Temos que fortalecer os Caps, residências terapêuticas em todo o Brasil e não só na Paraíba”, ressaltou. 

No caso de apenados que cometeram crimes muito graves, ela lembrou que, exatamente por isso, é importante ter um psiquiatra na equipe. “Esse médico tem condições de dizer se o paciente é imputável ou inimputável. Teremos que ter o discernimento de dizer que na hora do ato o paciente tem condições de entender o que estava fazendo”. 

Conforme analisou a médica, o paciente que está em surto psicótico tem uma visão distorcida da realidade. “Isso não dura minutos ou segundos. Isso vem sendo apresentado antes, com alteração do pensamento, do comportamento. E ele não tem sequer condições de dizer que está em surto psicótico. Todo embasamento será no laudo psiquiátrico”, enfatizou. 

Ela lembrou ainda que, no caso de alguém que fez uso da cocaína, pode levar a surto psicótico, delírio e alucinações que duram horas. “Cessado o efeito da droga, a realidade volta. O álcool potencializa isso. Nesse caso, é encaminhado à unidade prisional e a equipe vai ver o histórico do paciente. Esquizofrénico não é do dia para a noite, nem o bipolar. Diferente do que faz uso de substância psicoativa”, frisou. 

Fim das penitenciárias forenses

A psiquiatra Camilla Franca, diretora do Complexo Psiquiátrico Juliano Moreira, lembrou do Holocausto Brasileiro, que aconteceu no Centro Hospitalar Psiquiátrico de Barbacena, em Minas Gerais, que funcionou de 1903 a 1996. Lá, por conta do descaso do Estado, dos médicos e da sociedade, foram mais de 60 mil mortes. 

“O paciente psiquiátrico precisa de respeito e tem direito de viver em sociedade. Temos uma lei de 2001 que veio como uma forma de enxergar o paciente psiquiátrico como uma pessoa que precisa de tratamento para viver em sociedade. A política manicomial teve um prazo de dez anos para fechamento dos hospitais de custódia”, disse.

A psiquiatra enfatizou que são 32 unidades psiquiátricas no Brasil com determinação de fechar. A partir de 28 de fevereiro ninguém mais entraria e os que estivessem teriam que sair até o prazo final, que é 31 de maio. 

Ela relatou que foi feita uma cartilha de orientação que diz que o paciente que for julgado em audiência de custódia e afirma ter transtorno mental tem que passar por uma equipe formada por multiprofissionais, entre eles, psicólogo e psiquiatra, para analisar para onde seria melhor direcionar esse paciente. “A cartilha fala em hospital geral”, comentou. 

Na prática, apenas o Centro de Apoio Psicossocial (Caps 24) dá assistência a todo paciente com problema mental. Tem também o Caps voltado para pessoas com problemas relacionados ao álcool e drogas e também o infantil, conforme verificou a diretora. 

Ela lembrou que o SUS foi lançado em 1989 e tem um baixo investimento em saúde mental. Segundo a médica, um levantamento da Sociedade Panamericana diz que apenas 3% do investimento é para saúde mental.

“O paciente, às vezes, chega muito agressivo, em pleno surto, e a maioria é encaminhada para o Completo Juliano Moreira. É paciente com transtorno mental e não em conflito com a lei. O objetivo é trazê-lo  de volta à sociedade. A lei preconiza ter educadores físicos e terapeutas. Ele não pode ficar no leito psiquiátrico. Quando restabelecer a sanidade, deve ser inserido na sociedade”.

Psiquiatria Forense 

Na Penitenciária de Psiquiatria Forense há, hoje, 105 pessoas que praticaram crimes, mas a psiquiatra Camilla Franca ressaltou que o percentual de pessoas que têm algum problema mental e estão em conflito com a lei é de 0,5%. “15 de maio é o prazo para retirar todas as pessoas de dentro da penitenciária forense e existem casos, como um esquizofrênico crônico, que temos uma certa dificuldade de manejar”, afirmou. 

A Lei aponta que um grupo de profissionais abalizados fará o acompanhamento para dizer para onde será encaminhado cada paciente, para saber se ele tem ou não condições de viver em sociedade. A lei diz que há casos em que o paciente cometeu um crime, e após análise dos profissionais, ele pode voltar para casa. 

Questionada se esta seria uma espécie de anistia ou passaporte para a impunidade, ela afirmou: “A cartilha aborda o fato de pessoas que querem se aproveitar da audiência de custódia afirmando que têm transtorno mental. Ele será levado à unidade prisional, o juiz aciona a equipe e esta fará o direcionamento. Quem está em surto vai para hospital e sanada a crise, o surto, irá para rede de assistência psicossocial. E se a família não quiser acolher, existe a opção de residência terapêutica”, explicou. O problema, como voltou a observar, é que não há vagas para todos.

Camilla Franca diferenciou que o Juliano Moreira é uma instituição de saúde que acolhe pacientes com transtornos mentais, não com problemas na Justiça. Já a Penitenciária de Psiquiatria Forense, que é vizinha ao Juliano Moreira, será esvaziada. “É administrada por policiais penais. E é para pacientes que cometeram crimes. Essa vai fechar”. 

Perigo da liberação do uso de drogas

O consumo de drogas também tem levado os médicos a discutirem a situação desde a porta de entrada, que são as drogas lícitas. “Para nós, da Psiquiatria, é preocupante. A porta de entrada é o álcool e o tabaco. A maconha é a mais usada hoje e a substância THC leva o usuário ao delírio e surto psicótico. Há pacientes predispostos à esquizofrenia e o uso da maconha se torna um gatilho para esse transtorno psicótico. Liberando a maconha, teremos um aumento de pessoas com esquizofrenia”, afirmou Camilla Franca. 

A dependência não é apenas de álcool e drogas. Jogos de apostas também têm crescido. “Mexe com a dopamina, o sistema de prazer do cérebro. É igual ao consumo de uma droga, e são contraídas dívidas enormes. A dependência tecnológica é semelhante.

Ela observou que uma pesquisa apontou que mais de 60% da população usou álcool no período de um ano. Por isso, segundo a psiquiatra, a maior preocupação é a dependência do álcool. “Depois passamos pela dependência da nicotina, maconha, crack, cocaína, que causam preocupação médica, mas a tolerância é muito grande e cada vez precisam de maior quantidade. É aí que começam a cometer delitos. É uma questão de saúde, mas também da sociedade como um todo”, pontuou. 

Alguns médicos dão laudos falsos em perícia previdenciária

Além das questões criminais, o psiquiatra faz laudos de transtornos para concessão de benefícios, laudos periciais, porém algumas pessoas inventam que têm algum problema para poder receber dinheiro. Nesses casos, o profissional tem que ter um olhar matemático para dar um parecer ou laudo psiquiátrico. No entanto, conforme a diretora do Complexo Juliano Moreira, também há médicos que cometem erros. 

“Nossa realidade hoje, principalmente na perícia previdenciária. São médicos que se dizem psiquiatras e dão laudos falsos. Existe negligência, imperícia e imprudência. Já identificamos certos profissionais que dão laudos falsos. Temos que percorrer o histórico do paciente e quando fazemos perguntas, o paciente escorrega e aí é descoberto”, afirmou Camilla Franca.

Ela destacou que 65% da comunicação do ser humano é corporal, e os profissionais estudam o comportamento humano. Apenas 35% é o que ele diz. “Colocamos a atitude simulativa para o juiz. Há Instagram ensinando as pessoas como enganar as perícias”. Ele ressaltou que há pessoas que têm necessidade do benefício e há demora porque pessoas de má índole atrapalham o processo. 

O Juliano Moreira atende 219 municípios, com exceção da região metropolitana que tem o Pronto Atendimento em Saúde Mental (Pasm).

Por: ClikPB

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